Leonardo Boff

Como enfrentar o fundamentalismo (Parte final)

Todas estas manifestações humanas são portadoras de valor e de verdade. Mas são um valor e uma verdade relativos, vale dizer, relacionados uns aos outros, inter-relacionados, sendo que nenhum deles, tomado em si, é absoluto.
Então não há verdade absoluta? Vale o “everything goes” de alguns pós-modernos? Traduzindo: “vale tudo”? Não há o vale tudo. Tudo vale na medida em que mantem relação com os outros, respeitando-os em sua diferença e não prejudicando-os.
Cada um é portador de verdade mas ninguém pode ter o monopólio dela, nem uma religião, nem uma filosofia, nem um partido politico,nem uma ciência. Todos, de alguma forma, participam da verdade. Mas podem crescer para uma compreensão mais plena da verdade, na medida em que se relacionam.
Bem dizia o poeta espanhol António Machado: “Não a tua verdade. A verdade. Vem comigo buscá-la. A tua, guarde-a”. Se a buscarmos juntos, no diálogo e na recíproca relacionalidade, então mais e mais desaparece a minha verdade para dar lugar à nossa Verdade, comungada por todos.
A ilusão do Ocidente, dos USA e da Europa, é de imaginarem que a única janela que dá acesso à verdade, à religião verdadeira, à autêntica cultura e ao saber crítico é o seu modo de ver e de viver. As demais janelas apenas mostram paisagens distorcidas.
Pensando assim, se condenam a um fundamentalismo visceral que os fez, outrora, organizar massacres ao impor a sua religião na América Latina e na Áfica e, hoje, fazendo guerras com grande mortandade de civis, para impor a democracia no Iraque, no Afeganistão, na Síria e em todo o Norte da África. Aqui se dá também o fundamentalismo, de tipo occidental.
Devemos fazer o bom uso do relativismo, inspirados, por exemplo, na culinária. Há uma só culinária, a que prepara os alimentos humanos. Mas ela se concretiza em muitas formas e as várias cozinhas: a mineira, a nordestina, a japonesa, a chinesa, a mexicana e outras.
Ninguém pode dizer que só uma é a verdadeira e gostosa, por exemplo, a mineira ou a francesa, e as outras não. Todas são gostosas do seu jeito e todas mostram a extraordinária versatilidade da arte culinária.
Por que com a verdade deveria ser diferente? A base do fundamentalismo é essa arrogância que de que o seu modo de ser, sua ideia, a sua religião e a sua forma de governo é a melhor e a única válida no mundo.

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